Artigo: O novo regime fiscal

Postada em: 04/10/2016

Por Tiago Nasser Sefer(*)

Após o conturbado período que compreendeu a eleição presidencial de 2014 e o impeachment de 2016, o brasileiro aparentemente vive um momento grande consciência política. Grandes temas foram levantados e recebem ora apoio, ora crítica da extensa plateia que se formou. Mas hoje a plateia não só assiste, ela participa e influencia permanentemente as decisões, como poucas vezes se viu. 
Exemplo básico é a controversa Proposta de Emenda à Constituição 241/2016 que visa instituir o chamado “Novo Regime Fiscal”. A PEC cria um teto de gasto anual para o governo federal, para vigorar por vinte anos. A grosso modo, o limite de cada ano seria a despesa primária realizada no exercício financeiro anterior, corrigida pela inflação. 
A previsão é que se encerre 2016 com um déficit de 10% do PIB, o que significa dizer que o governo gasta mais do que recebe. Qualquer cidadão que se encontre em tal situação no seu orçamento residencial sabe que só tem duas alternativas viáveis: ganhar mais ou gastar menos. Se não o fizer, o risco de calote aumenta e pode acabar indo pro SERASA. 
Ganhar mais, em escala pública, significa dizer aumentar tributos, opção politicamente inviável. Gastar menos, por sua vez, carrega o estigma de tirar direitos dos cidadãos. Quando deparado com tal conflito - idos de 2013 - o governo petista tomou uma medida arriscada: dobrou a aposta e gastou ainda mais, acreditando que o gasto público poderia gerar empregos e reaquecer a economia. 
Tudo seria perfeito, se a primeira regra da economia não fosse a da escassez, onde toda escolha implica uma renúncia. Nem se precisa falar qual foi o desastroso resultado do populismo fiscal. Os sinais de alerta foram lançados pelas agências de risco, que tiraram do Brasil o grau de investimento (equivalente a uma negativação no SERASA). 
A PEC 241 vem para corrigir a lógica nefasta de aumentar gastos, fazendo isso de maneira coerente e que encontra fundamento nas mais sólidas teorias econômicas e cálculos contábeis. Já que não é razoável aumentar a carga tributária brasileira, o caminho é contingenciar despesas. 
Portanto, a proposta traz maior segurança, para garantir ao cidadão de que o governo não vai se endividar indefinidamente e, no fim da festa, cobrar a conta do contribuinte, algo que a Lei de Responsabilidade Fiscal não conseguiu impedir. 
A maior preocupação dos críticos são os programas sociais, os benefícios às classes mais necessitadas, o SUS e etc. Não nos parece ser uma contestação consistente, na medida em que são, em sua maioria, despesas obrigatórias. Ademais, existem muitas despesas facultativas que podem ser cortadas antes, como benefícios fiscais ineficientes, preços represados, subsídios desnecessários e odiosos privilégios a classes “iluminadas”. 
O Novo Regime Fiscal não será a solução para todos os problemas nacionais, mas é um grande e consistente primeiro passo, recebendo elogios do próprio FMI. A reforma da previdência e a desburocratização do ambiente de negócios são os passos seguintes. Conceder segurança jurídica também deve ser sempre uma preocupação. Afinal, quem quer ter empresa em um país em que contratos são constantemente anulados e suas cláusulas modificadas? 
A base da análise econômica do direito é que os indivíduos são racionais e reagem a incentivos. Um bom exemplo no controle das contas públicas seguramente seria um desses incentivos, com papel importante para estimular a economia brasileira e passar a confiança que o brasileiro e o estrangeiro precisam ter para investir no país, com a consequente geração de emprego e renda. 
Para o novo regime funcionar, a previsibilidade é importante, para não dizer fundamental. Hoje, a única coisa que se pode prever é que, sem qualquer mudança, o Brasil em breve deixará de ter a escolha entre gastar menos ou ganhar mais. Terá que fazer a difícil escolha entre dar calote ou tolerar a temida volta da inflação galopante. 

(*)Tiago Nasser Sefer 
Mestre em Direito Tributário 
Advogado e Procurador Autárquico e Fundacional do Estado do Pará 
Professor de Direito Financeiro e Tributário 

Fonte:ORM